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#004: uma breve retrospectiva
o que acontece com isso de diminuir consideravelmente meu uso de redes sociais é que eu perdi um dos referências externos principais que eu tinha para marcar passagem do tempo — é uma loucura isso, e em parte é por essa loucura que eu decidi diminuir o uso das redes (projeto touch grass 2023, i am cringe but i am free etc.), mas ainda assim é verdade. o registro constante do que faço e do que penso e do que escrevo e do que leio e de quem vejo e do que visto e do que entra e sai da minha cabeça acaba tendo uma função organizacional do cérebro que se embaralhou nesse primeiro semestre do ano, combinado com o embaralhamento ainda mais intenso disso tudo causado pelos últimos três anos de pandemia, tem intensificado uma impressão estranha de desconexão. por um lado, é bom: sair da lógica da atenção que as redes dominam, esse micropoder de notar e ser notado, de apertar o botãozinho de dopamina do meu sol em leão, me ajuda a firmar mais no chão o lado em terra do meu mapa astral e lembrar da insignificância da minha vida em particular (e, por consequência, da igual significância de todas as vidas). por outro lado, é esquisito: essa vida que anda e anda e em que as coisas acontecem e passam de umas às outras sem um álbum de memórias externas e interativas e constantes, o tempo que corre de outro jeito.
(toda vez que abro essa newsletter, eu tento não falar de evitar redes sociais; toda vez, acabo falando.)
é que estamos bem no meio do ano, né, e eu parei pra olhar pra esse primeiro semestre, nessa hesitação ainda temerosa de ver as coisas se mexendo depois de 3 anos em que senti tudo meio parado meio arrastado meio lento meio embolado meio difuso (sentimos todos) (toda vez também tento não falar da pandemia; toda vez, acabo falando). tem um semestre pela frente ainda neste ano, e tenho tantos planos pra ele, e eu sinto que estou finalmente recuperando as noções de passado e de futuro que eu tinha perdido nesses tempos. mas o presente continua meio estranho.
retrospectiva (ou: algumas coisas que fiz nesses últimos 6 meses)
semana passada eu acabei o semestre no curso de espanhol. fazia tempo que queria voltar a estudar espanhol formalmente, depois dos dois semestres de eletiva na faculdade em que mais matei aula do que frequentei, e fazia também tempo que queria experimentar estudar no abraço cultural, um projeto muito legal de aulas de línguas ministradas por professores refugiados. esse ano, me juntei com a ge, porque com amiga para encorajar a coisa fica mais fácil, e comecei o curso. adorei tirar um tempo toda semana para aprender uma coisa e exercitar esse músculo mental. já estou me sentindo bem mais confiante na língua e animada para continuar no semestre que vem, e, enquanto isso, vou treinando com leituras, podcasts, filmes e séries. ah: e pra quem também tem vontade de estudar uma língua estrangeira, as inscrições para o intensivo de férias do abraço cultural estão abertas até hoje, para inglês, francês, espanhol, e árabe, e tem turma online!
meu apartamento (como acho que comentei na última newsletter) está em obras, e enquanto isso eu e pandora estamos morando com minha avó. é uma mudança intensa, meses de uma vida em outro ritmo, em outro lugar, e a expectativa de voltar para uma casa novinha em folha, mas está sendo uma delícia (apesar de obra ser sempre estressante). agora estamos na reta final, e eu mal posso esperar para curtir meu apartamento na versão estúdio mab (inclusive, recomendo horrores o trabalho da tany, que é profissional, talentosíssima, e ainda por cima um anjo de paciência com minha enrolação crônica).
além de são paulo (onde estou agora, e que já é parte da rotina), viajei para fora do rio de janeiro duas vezes: comecei o ano, como comentei na primeira newsletter, no ceará, com uma semana de férias, sol, caipirinha e família. depois, em abril, eu e laura fomos comemorar o aniversário dela em maceió, e curtimos dias lindos de turismo, praia, amigos, e muita comida boa.
no lado criativo-profissional da coisa, eu comecei o processo de revisar/reescrever uma história que #vemaí. não posso dar detalhes ainda até anúncios oficiais, mas tem sido uma experiência incrível ver uma história que passou tantos anos indo e vindo na minha cabeça tomar finalmente sua forma final, com a ajuda do trabalho incansável de profissionais incríveis. e, também no contexto sofia-escritora, saiu recentemente o audiobook do meu conto festa infernal, com narração de leticia madeira! para mais informações sobre o conto e links para ebook e audiobook, vejam a página dele no meu site.
enquanto isso, o trabalho anda (felizmente, como sempre) movimentado. só esse ano já foram publicados 14 livros que traduzi e mais 7 que preparei, e tem muito mais vindo por aí.
leituras do mês*
acabei nossa parte de noite (nuestra parte de noche, trad. elisa menezes), de mariana enriquez, e ando recomendando a torto e a direito. é um livraço (tanto no sentido de calhamaço, quanto no sentido de ótimo), que mostra a potência do horror latinoamericano quando se mistura aos horrores diários da existência no continente (sobre esse tema, inclusive, recomendo muito o texto “the h word: horror in a country that is not afraid of death”, do dante luiz).
seguindo no terror latinoamericano, peguei distancia de rescate, da samantha schweblin, depois de ver o filme (tem na netflix, e aqui no brasil ficou com o nome de o fio invisível). eu gostei muito do estilo da autora, e o livro é curto, envolvente e com a tensão de um pesadelo do qual é impossível sair, mas ter visto o filme antes acabou dando uma desanimada na minha experiência porque o filme usa em voice-over um pedaço muito grande do texto do livro, de modo que, ao ler, senti que estava relendo algo já lido antes. recomendo a leitura (eu li em espanhol, mas o livro saiu aqui como distância de resgate, com tradução de ivone c. benedetti), mas vejam o filme só depois.
o último dessa sequência de terror latinoamericano foi mandíbula, de mónica ojeda (que também li em espanhol, mas saiu aqui com o mesmo título e tradução de silvia massimi feliz), que eu também adorei e já comecei a recomendar para muita gente. é visceral e angustiante, e é muito indicado para quem, como eu, gosta especialmente do terror inerente em existir como menina adolescente. comecei a ler em parte por causa dessa newsletter maravilhosa da luisa pinheiro, apesar de ela ter dito que nem gostou tanto assim da história.
enquanto isso, no mundo dos audiobooks,** comecei o mês com all this could be yours (narração de thérèse plummer), de jami attenberg, porque vi alguém recomendar pra ocupar o vazio de succession na minha vida. não é mordaz como a série, mas é um bom drama de sucessão de uma família de gente rica, e eu gostei de como ela varia os pontos de vista de modo a compor aos poucos uma imagem completa das relações.
depois, comecei a escutar the pallbearers club (narração de graham halstead, xe sands e elizabeth wiley), do paul tremblay. acabou que eu amei tanto o primeiro livro que li do tremblay, a head full of ghosts, que sinto que me decepcionei um pouco com os dois que li em seguida (o outro foi cabin at the end of the world, que deu origem ao filme knock at the cabin). ainda assim, gostei de pallbearers como exploração de uma amizade complicada de vida inteira entre dois personagens que vivem se desencontrando; tem um quê de normal people ali no fundo que achei interessante.
agora, os dois que estou lendo, apesar de ainda bem no começo, são the unbroken, de c.l. clark, e y/n (em audio, com narração de greta jung), de esther yi. como ainda não avancei muito em nenhuma das duas leituras, não tenho comentários, mas na próxima newsletter venho comentar.
*sem contar leituras de trabalho
**ouço audiobook sempre pelo scribd. para quem tiver interesse em experimentar 60 dias grátis, dá para se inscrever pelo meu link (e aí eu ganho 30 dias grátis também).